Quando o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central brasileiro decidiu, finalmente, por cortar os juros básicos da economia em sua última reunião no início de agosto – iniciando o primeiro ciclo de redução da Selic em três anos –, o Ibovespa vinha de um rali e acumulava mais de 10% de valorização em 2023 até então.
Na ocasião, o BC surpreendeu uma boa parte do mercado, sobretudo os economistas, ao fazer uma redução de 0,5 ponto percentual da Taxa Selic [a aposta majoritária era por um início mais tímido, cortando 0,25 p.p.].
O que se esperava para a Bolsa com esse movimento mais agressivo do Copom?
Era alta. Mas o que aconteceu foi o contrário. O Ibovespa emendou uma queda de 5,7% em agosto, tendo registrado, além de tudo, uma sequência inédita de 13 quedas consecutivas.
Agora, às vésperas de mais um encontro, nesta quarta-feira (20), cuja aposta majoritária é por um novo corte de 0,5 p.p., o que se discute não é mais o início do ciclo de corte, mas, sim, sua magnitude e velocidade de redução.
“Acreditamos que uma boa parte da perspectiva de queda de juros já foi precificada, mas não tudo. No entanto, estamos observando a expectativa de queda reduzir e ocorrer de forma mais suave”, afirma Phil Soares, chefe de análise de ações da Órama. A casa projeta Ibovespa aos 125 mil pontos ao final do ano.
Ibovespa: Sem dinheiro novo
Em meio à derrocada da Bolsa em agosto, o JP Morgan observa que o período foi marcado por volumes mais baixos de negociação e sem entrada de “dinheiro novo”, com saída de estrangeiros.
Do ponto de vista local, o JPMorgan diz acreditar que novos recursos só começariam a entrar quando os juros no Brasil forem reduzidos ao patamar de um dígito.
A estrategista do JP para América Latina e Brasil, Emy Shayo Cherman, escreveu um relatório, com base em encontro com investidores institucionais no final do mês passado, que é revelador. Segundo ela, uma parte desses interlocutores acredita que os mercados já precificaram o ciclo de alívio monetário.
“Também houve questionamentos sobre o quanto o Brasil pode baixar juros, considerando o nível dos fed funds [os juros dos Estados Unidos]”, escreveu Emy.
Soares, da Órama, diz que esse diferencial de juros vai ser relevante para o comportamento do Ibovespa.
“Mesmo assim, acreditamos que o saldo vai ser positivo, puxando a nossa Bolsa para cima. Há uma parte da alta a ser precificada, à medida que os juros no Brasil forem, de fato, caindo.”
Investidor de longo prazo segue fora da Bolsa
Marcelo Guterman, especialista em investimentos da Western Asset, explica que o investidor institucional – que tem visão de longo prazo e “coloca dinheiro na Bolsa de maneira mais estável” – continua de fora do mercado acionário, pois os juros reais da economia (diferença entre a Selic e a inflação) seguem elevados, o que beneficia a renda fixa.
“Eu diria que esse investidor (institucional) precisaria ver a Selic abaixo de 9%, com uma taxa de juros real na faixa de 4%. A partir daí, ele começaria a pensar em uma diversificação e em aumento de exposição a risco”, afirma.
Guterman observa que toda a curva de juros, que reflete a percepção dos traders, ainda está em dois dígitos. Segundo ele, o Copom precisa dar sinais de que pode acelerar o ciclo de alívio para que a curva volte a cair.
“Para tanto, o BC precisaria ver uma atividade um pouco mais fraca e expectativas de inflação mais longa ancoradas à meta. E você tem alguns dados na contramão disso”, argumenta.
Macro, fiscal e política
A cada semana, os economistas consultados semanalmente pelo Banco Central vem revisando para cima suas projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Nos últimos relatórios, a mediana para o PIB de 2023 tem ficado cada vez mais próxima dos 3% e as previsões para 2024 também vêm sendo elevadas a cada boletim.
Quanto à expectativa para a inflação no longo prazo, os economistas projetam IPCA de 3,5% para 2025 e 2026, ainda acima da meta nos anos 2025 e 2026.
“Isso indica incertezas em relação à política fiscal no longo prazo”, diz Guterman.
Exatamente essa falta de ancoragem das expectativas é que prejudica uma redução mais mais consistente e duradoura dos juros – essencial para o investidor de Bolsa.
Conforme apurado pelo InfoMoney com fontes em Brasília, por exemplo, já é dado como certo que o governo não será capaz de cumprir com a meta de déficit zero em 2024.
E, para não enfraquecer as medidas fiscais de aumento de receita e evitar o avanço de pautas-bomba, a equipe econômica deve adiar ao máximo o anúncio de uma revisão.
Em suma, uma mudança na meta de zerar o déficit público tende a acarretar em maiores despesas, desestimulando outras medidas de ajuste.
Volta do Estrangeiro ao Ibovespa
Por fim, para que a Bolsa volte a deslanchar o dinheiro gringo será vital. Em agosto, o que ajudou a derrubar o Ibovespa foi exatamente porque o dinheiro estrangeiro evaporou. Foram R$ 10,4 bilhões em vendas líquidas.
Conforme a XP, parte da saída do estrangeiro pode ser atribuída ao alto rendimento dos juros dos títulos do Tesouro dos EUA, que atingiu maior nível desde 2007.
Quando isso acontece, o investimento na renda fixa fica mais atrativo e, sendo a aplicação nos Treasuries a mais segura do mundo, houve a saída maciça da renda variável.
Ou seja, o dinheiro “ganho” pelo estrangeiro entre março e julho – com o Ibovespa acumulando alta superior a 26%, em cerca de 100 dias, foi “realizado” em agosto.
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Ibovespa: Fomc será decisivo
Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, acredita que a Bolsa brasileira pode voltar a ganhar o impulso do investidor estrangeiro a depender das mensagens do Federal Reserve, nesta quarta-feira (20).
“Se o investidor estrangeiro ficar confortável com a ideia de que o Fed encerrou seu ciclo de aperto, deve retornar à renda variável e o Brasil deve se beneficiar também”, afirma.
Cabe ressaltar que, apesar da saída em agosto, o estrangeiro acumula ingresso líquido de R$ 11,612 bilhões, ajudando no ganho acumulado da Bolsa em 2023.
Em setembro, os dados preliminares, até o pregão do dia 13/9 (último disponibilizado até agora pela B3), mostram um pequeno saldo positivo, de R$ 10,4 milhões – demonstrando que o estrangeiro está em compasso de espera pela “Super Quarta”.
“Agora, fundo de pensão deve demorar bastante para voltar a ficar interessado. Pessoa física no Brasil, só quando a renda fixa mostrar que está remunerando menos”, complementa o estrategista.
Em ambos os casos, juros básicos de um dígito ainda vão ser cruciais para uma retomada do investimento em Bolsa.
(Com Rodrigo Petry e Marcos Mortari)
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