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O Japão queria inflação mais alta – e conseguiu, mas está pagando caro por isso


Enquanto o resto do mundo lutava para controlar a inflação, um país a aceitou de braços abertos.

Nos últimos anos, o Japão experimentou uma alta na inflação, que foi impulsionada por interrupções na cadeia de abastecimento devido à pandemia e choques geopolíticos, como tentativa de tirar a economia de um ciclo de décadas de crescimento fraco e pressão deflacionária. Assim, enquanto os principais bancos centrais, como o Federal Reserve dos EUA, aumentaram as taxas de juros para controlar os preços, o Banco do Japão manteve as taxas baixas à medida que a inflação acelerava.

A teoria era que, ao manter as taxas de juros mínimas, o banco central poderia aproveitar o aumento temporário dos preços para promover o tipo de inflação que buscava há muito tempo: um crescimento econômico moderado, estável e sustentado.

Sede do Banco do Japão (BoJ) em Tóquio – 18/03/2024 (Foto: Kim Kyung-Hoon/Reuters)


As empresas poderiam justificar os aumentos de preços mencionando seus custos crescentes, resultando em receitas mais altas que seriam destinadas a aumentar os salários dos trabalhadores. Com mais dinheiro nos bolsos, os consumidores poderiam gastar mais, criando um ciclo econômico positivo.

Houve alguns sinais promissores: grandes empresas japonesas, como a Toyota, reportaram lucros substanciais e prometeram os maiores aumentos salariais para os trabalhadores em décadas. Em março, o Banco do Japão aumentou a sua taxa diretora pela primeira vez em 17 anos, concluindo que a economia havia alcançado o “ciclo virtuoso” entre salários e preços que tinha visualizado.

Antes da reunião do Banco do Japão desta semana, há um número crescente de sinais de que nem tudo está saindo como planejado.

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O compromisso do banco central nos últimos anos de manter as taxas baixas não só permitiu que a inflação aumentasse. (Ela está acima da meta de 2% dos decisores há mais de dois anos.) Também provocou a queda do iene, de repente deixando mais caros os alimentos, combustíveis e outros produtos importados. A isso os consumidores responderam cortando drasticamente seus gastos.

Devido à baixa demanda, pequenas empresas têm enfrentado dificuldades para aumentar os preços e os salários, ao contrário do que esperavam os formuladores de políticas do país. E ainda não está claro se os aumentos salariais nas grandes multinacionais estão se refletindo nas empresas japonesas mais voltadas para o mercado interno.

Alguns economistas sugerem que o baixo nível de consumo na economia japonesa é uma resposta à política de taxas baixas do Banco do Japão, o que aumenta o receio dos consumidores de que a inflação continue a superar os aumentos salariais nos próximos anos. Os analistas estão praticamente divididos sobre se as autoridades do Banco do Japão aumentarão as taxas ou se as manterão estáveis na quarta-feira, quando devem anunciar sua decisão.

O BOJ esperava que a inflação temporária pudesse evoluir para uma inflação duradoura, impulsionando os salários e dando um novo impulso à inflação. “Mas não acredito que esse seja o caso”, disse Takahide Kiuchi, economista executivo do Nomura Research Institute e ex-membro do conselho de política monetária do banco central do Japão.

Segundo ele, os gastos “surpreendentemente fracos” dos consumidores e a queda do iene “têm todos uma raiz: erros de política monetária cometidos no Japão ao longo de vários anos”.

Se o Banco do Japão tivesse aumentado as taxas anos antes, analisou Kiuchi, “o iene não teria desvalorizado tanto, a atividade do consumidor teria ficado mais estável e a economia provavelmente estaria melhor”.

Recentemente, em uma tarde abafada no noroeste de Tóquio, Yumiko Umemura, de 49 anos e mãe de dois filhos, passou em um açougue para comprar uma mistura de carne bovina e carne de porco moídas. Segundo Umemura, suas contas de supermercado aumentaram nos últimos anos, enquanto seu salário em uma empresa de processamento de dados permaneceu inalterado, um aperto no orçamento de sua família que ela acredita que persistirá por algum tempo.

Isso a fez procurar maneiras de economizar, como comprar 250 gramas de carne em vez de 300. “Comprar sem excessos, é assim que venho reduzindo”, explicou.

Yoshimasa Yamamoto, proprietário do açougue, disse que enfrenta a combinação de desaceleração nas vendas e aumento de custos. Até mesmo a carne de origem local está mais cara, disse ele, devido ao fato de que a alimentação do gado é majoritariamente importada.

Yamamoto disse que gostaria de aumentar os preços, mas sente que não pode porque durante décadas seus clientes conheceram apenas preços estagnados.

“Os clientes estão habituados aos nossos preços e, se os aumentarmos, não comprarão”, disse. “As pessoas já pararam de comprar de qualquer forma, como poderíamos aumentar os preços?”

Estas dinâmicas estão começando a aparecer na economia mais ampla do Japão. Embora tenham aumentado, os salários não conseguiram acompanhar o ritmo dos preços, fazendo com que os salários ajustados à inflação tenham apresentado quedas durante 26 meses consecutivos, até maio. Os gastos do consumidor, ajustados pela inflação, caíram pelo quarto trimestre consecutivo.

A economia do Japão encolheu em dois dos últimos três trimestres, perdendo sua posição como a terceira maior do mundo para a Alemanha. Neste mês, o Gabinete do Governo do Japão revisou para baixo sua previsão de crescimento econômico para o ano fiscal até março de 2025, de 1,3% para 0,9%, principalmente devido à redução nos gastos dos consumidores.

“A demanda do consumidor está fraca. A taxa de poupança caiu para zero. As pessoas estão tendo que gastar seus rendimentos”, afirmou Richard Katz, economista e autor de um livro recente, “The Contest for Japan’s Economic Future” (A disputa pelo futuro econômico do Japão, em tradução livre). “Presumir que as empresas conseguirão repassar os salários – o Banco do Japão está vendo as coisas através de um prisma que lhes diz o que querem ver.”

NYT: ©.2024 The New York Times Company

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